outubro 16, 2006

Proposta de Revitalização da Baixa-Chiado

MODELO DE FINANCIAMENTO DOS INVESTIMENTOS DO SECTOR PÚBLICO

Modelo global de mobilização de recursos financeiros: uma combinação de responsabilidades e oportunidades e um equilíbrio de fontes, formas e prazos de financiamento.


5.1 Introdução

O projecto de recuperação, reabilitação e revitalização da Baixa-Chiado envolve a realização de um conjunto alargado e diversificado de investimentos públicos e privados, no quadro de um perfil temporal longo (o prazo de uma “geração”), mas não monótono, nem linear, com destaque para a articulação entre uma primeira fase, que tudo aconselha que coincida com o próximo ciclo de gestão dos fundos estruturais (2007-2013), onde se inclui uma fase de arranque (2007-2010) para a concentração de esforços e meios nas “urgências” e nos projectos com maior aptidão para gerar mudanças irreversíveis, e uma entrada em velocidade de cruzeiro depois de 2013.

A estimativa da dimensão financeira da intervenção foi feita, neste quadro, na base de produção de valores indicativos de referência suficientemente rigorosos, nomeadamente no que respeita aos projectos estruturantes, que não podem, nem devem, ser confundidos com valores orçamentais completos, detalhados e definitivos.
O horizonte temporal adoptado, para a estimativa destes valores de referência, foi polarizado pelo ano de 2020, procurando, sobretudo, evidenciar a concentração preconizada para a fase de arranque. O Comissariado entendeu que o seu mandato seria melhor cumprido não se substituindo aos grandes (e pequenos) protagonistas e promotores do processo de revitalização da Baixa-Chiado e, portanto, não entrando em especificações e particularidades que, verdadeiramente, devem ser decididas projecto a projecto com base na visão e na estratégia apresentadas com os ajustes e transformações que resultarem da sua validação política democrática.

O modelo de financiamento preconizado, tendo em conta a estimativa da dimensão financeira, corresponde a uma alavancagem sucessiva de meios financeiros.
Em primeiro lugar, no “terreno” do sector público, onde a tomada de responsabilidades financeiras relevantes pela Câmara Municipal de Lisboa, sustentadas, em parte, pelo retorno previsível de receitas a médio prazo induzido pelos resultados do próprio processo de revitalização, justifica e conforta a tomada de outro tipo de responsabilidades, não só financeiras, pelo Governo, seja no âmbito da racionalização e modernização da administração pública, seja no âmbito da afectação de recursos associada à gestão das agências e institutos públicos com intervenção no espaço da Baixa-Chiado, seja no âmbito da prossecução das suas políticas, em particular da sua política de desenvolvimento das cidades.

Em segundo lugar, no “terreno” da cooperação entre os sectores público e privado, onde a programação segura de um conjunto de investimentos públicos, municipais e nacionais, associada ao estabelecimento de uma estratégia credível, traduzida em regras claras e estáveis e prosseguida por estruturas de gestão e acompanhamento ancoradas em processos de decisão rápida e objectiva, constitui o principal, e suficiente, incentivo para uma progressiva afirmação do investimento privado, como grande e principal motor da operação global da revitalização da Baixa-Chiado. A lógica temporal diferenciada, preconizada para a concretização dos investimentos públicos (progressivo “phasing-out”) e privados (progressivo “phasing-in”) corresponde, assim, também, à construção de um processo, onde o sector privado encontra nas realizações do sector público a segurança suficiente para correr os riscos da inovação e do empreendedorismo que o caracterizam, e onde o sector público encontra no seu esforço de realização e de decisão atempada uma força acrescida para exigir ao sector privado níveis adequados de responsabilidade social, ambiental, económica e fiscal, que serão decisivos para o sucesso da operação proposta.

Na sequência dos trabalhos desenvolvidos pelo Comissariado da Baixa-Chiado relativamente à definição do programa de reabilitação a implementar na zona de intervenção, foi efectuada uma primeira estimativa dos custos de investimento, decompostos pelos períodos 2007-2010 e 2011-2020 e com a identificação da entidade responsável pelo seu financiamento (Estado, APL, Câmara Municipal de Lisboa, Privados, …), bem como uma projecção dos custos de estrutura para a implementação do projecto prevista no modelo institucional.

Em termos globais, o investimento total estimado para o Programa de Reabilitação da Baixa-Chiado para o período de 2007 a 2020 ascende a cerca de EUR 1145 milhões, dos quais cerca de EUR 682 milhões a realizar entre 2007 e 2010 e os restantes EUR 463 milhões entre 2011 e 2020.
Relativamente à afectação do investimento global pelas principais entidades responsáveis pela sua realização, prevê-se uma contribuição directa (excluindo eventuais parcerias a estabelecer com o Estado e/ou a Câmara Municipal de Lisboa) significativa por parte do sector privado da ordem de EUR 660 milhões (dos quais EUR 270 milhões até 2010), seguida pelos investimentos municipais de cerca de EUR 224 milhões (dos quais EUR 168 milhões até 2010), pelos investimentos da Administração Central com cerca de EUR 137 milhões (dos quais EUR 119 milhões até 2010), pelos investimentos a cargo da APL de EUR 71 milhões (integralmente até 2010) e das empresas concessionárias de utilities diversas (AdP, PT, EDP, GOP) com cerca de EUR 14 milhões (integralmente até 2010).

O lançamento dos projectos estruturantes é, sem dúvida, o motor do investimento privado na zona da Baixa-Chiado, pelo que será necessária uma execução atempada e coordenada de projectos estruturantes da responsabilidade do Estado e do Município, para que a dinamização do sector privado se torne uma realidade irreversível.
Por isso, a concentração do investimento público na primeira fase (2007-2010) será essencial para garantir que os objectivos deste projecto integrado serão atingidos.
Assim, e conhecidas que são as presentes limitações financeiras do Estado e da CML, são equacionadas no presente documento diferentes alternativas para a mobilização dos financiamentos necessários à implementação dos projectos estruturantes, designadamente através de modalidades que permitam captar capitais privados adicionais para o programa e alocar riscos dos projectos de investimento também ao sector privado, no âmbito de parcerias público-privadas. (...)


5.3 Modelo de Financiamento de Investimentos Municipais

De acordo com o modelo institucional preconizado, os investimentos municipais irão ser realizados pela sociedade de gestão urbana (SGU) (incluindo a Rede Viária Externa à Área de Intervenção – “Circular das Colinas”) e financiados tendo por base um contrato-programa a estabelecer com a Câmara Municipal de Lisboa.

Neste contrato-programa, a Câmara Municipal de Lisboa assumirá o compromisso de afectação de todas as receitas municipais geradas no âmbito da área da Baixa-Chiado à SGU para assegurar o financiamento do Projecto de Reabilitação da Baixa-Chiado.

Considerando o horizonte de 2007 a 2010 e o montante global de investimentos a realizar neste período de EUR 168 milhões, sugere-se a afectação a estes investimentos do montante do Fundo Remanescente do Chiado (± EUR 30 milhões) e também de fundos comunitários no âmbito do novo Quadro Comunitário de Apoio da ordem dos EUR 30 a EUR 60 milhões. A afectação do fundo remanescente do Chiado a este projecto parece ajustada aos objectivos com que foi criado.

Isto significa que o montante dos financiamentos bancários de longo prazo que serão necessários para os projectos municipais atinja EUR 78 a 108 milhões.

Como cenário central, será de assumir que o montante do financiamento a mobilizar será da ordem dos EUR 125 milhões, considerando a capitalização dos juros durante os 5 primeiros anos do projecto.
Com o presente Projecto, justifica-se que a tributação sobre o património imobiliário da zona histórica passe a ser idêntico ao do regime geral, mesmo que tal necessite de um período transitório entre 2007 e 2010.

Os primeiros estudos realizados com base nos dados recolhidos pela SRU indicam que o aumento do IMI decorrente deste projecto de reabilitação urbana (numa base conservadora) irá originar um aumento desta receita municipal da ordem dos EUR 10 milhões/ano. Para além desta receita camarária, outras também terão um forte incremento, tendo sido impossível a sua estimativa no curto espaço de tempo de trabalho do Comissariado da Baixa-Chiado.

Assim sendo, só esta base de acréscimo de receitas municipais decorrentes do IMI sustenta um financiamento de EUR 125 milhões, por um prazo de 25 anos, considerando uma taxa de juro de 5% e um prazo de reembolso de 20 anos:


5.4 Modelo de Financiamento dos Investimentos da Responsabilidade da Administração Central

As obrigações do Estado, directamente, através da APL ou ainda por via dos compromissos a assumir pela Carris e pelo Metro, no âmbito do Programa de Reabilitação da Baixa-Chiado, incidirão fundamentalmente sobre os seguintes projectos estruturantes:
(I.) Frente ribeirinha (EUR 32,8 milhões), para projecto de espaço público qualificado e integrado com a zona ribeirinha, da responsabilidade da APL;
(II.) Reabilitação do Terreiro do Paço (EUR 68 milhões), incluindo as arcadas e os pisos superiores e administrativos;
(III.) Equipamentos Culturais (EUR 40,6 milhões), incluindo um equipamento cultural na Doca da Marinha (Museu da Viagem), núcleo museológico no Convento de S. Francisco e valorização do ex-Convento do Carmo.

A exemplo do que foi referido para a CML, uma parte dos investimentos, designadamente na frente ribeirinha e na reabilitação do Terreiro do Paço, poderá ser suportada por entidades terceiras, nomeadamente os colectores e adutores da SIMTEJO e EPAL, respectivamente, cujo valor ascenderá a cerca de EUR 11,4 milhões, e as infra-estruturas de transportes que poderão ser cometidas à Carris e ao Metro, no valor de EUR 14,1 milhões.

Relativamente às restantes componentes de qualquer destes projectos estruturantes, o Estado poderá optar pelo seu financiamento directo ou, nomeadamente nos casos de projectos circunscritos e passíveis de rentabilização comercial, pelo mercado ou por arrendamento/pagamento pela disponibilização pelo Estado (casos de edifícios utilizados por serviços públicos ou equipamentos culturais), pela transferência para o sector privado da obrigação de construção, manutenção, exploração e financiamento.

Considerando, por um lado, o valor relativamente elevado previsto para os projectos estruturantes da responsabilidade do Estado (cerca de EUR 137 milhões para os projectos acima enunciados, a maior parte dos quais a realizar até 2010), e, por outro, o potencial de realização de parcerias com o sector privado numa parte substancial destes projectos (por exemplo, no Terreiro do Paço – arcadas e edifícios administrativos, e nos equipamentos culturais), afigura-se que será possível diferir o esforço orçamental do Estado com o financiamento de uma parte importante destes projectos estruturantes.

Da análise preliminar efectuada, estima-se que, numa situação extrema de recurso a parcerias com o sector privado para a execução dos projectos estruturantes, o esforço financeiro do Estado até 2010 poderia ser reduzido até cerca de EUR 15 milhões, ficando, no entanto, responsável pela regularização de uma parte significativa do custo do investimento a longo prazo (por exemplo, 30 anos) através do compromisso de arrendar/pagar pela disponibilidade de um conjunto mais ou menos alargado de edifícios e equipamentos públicos.


5.5 O modelo global de mobilização de recursos financeiros:uma combinação responsável de responsabilidades e oportunidades e um equilíbrio de fontes, formas e prazos de financiamento

O modelo global de mobilização de recursos financeiros para o desenvolvimento do projecto de recuperação, reabilitação e revitalização da Baixa-Chiado assume a forma de uma combinação complexa, mas equilibrada, de fontes e modos de financiamento.

Em primeiro lugar, importa explicitar que o modelo preconizado procura assumir as significativas restrições que a política orçamental e fiscal de consolidação orçamental, plenamente enquadrada na disciplina do Pacto de Estabilidade e Crescimento, não deixará de continuar a colocar num horizonte de médio prazo, isto é, contempla níveis de despesa pública (investimento e manutenção) que não induzem novos desequilíbrios orçamentais, por um lado, e prevê explicitamente as condições de sustentabilidade financeira de médio e longo prazo que importa garantir.

Os níveis de despesa pública previstos, nos diferentes níveis de administração pública (central, municipal e alargada) são, assim, não só compatíveis com o esforço de rigor orçamental em curso, como, sobretudo, desenhados numa lógica de racionalidade económica e optimização de recursos.

Em segundo lugar, importa compreender que o modelo preconizado procura ancorar solidamente o projecto nas oportunidades que se abrem, no horizonte da primeira fase e, sobretudo, da fase de arranque prevista (2007-2010), quer no plano do relançamento do investimento privado, onde a reabilitação e recuperação do património edificado constitui um vector importante de relançamento competitivo das actividades de construção e obras públicas (perante a irreversibilidade do fecho do ciclo de forte expansão quantitativa alimentada pela redução das taxas de juro e iniciado na segunda metade dos anos 90), quer do relançamento das políticas públicas de natureza estrutural directamente associadas aos objectivos de coesão, crescimento e emprego, onde o contributo da afirmação competitiva das cidades é explicitamente assumido pelas orientações comunitárias.

Os níveis de investimento privado e de mobilização de fundos estruturais previstos foram, assim, estimados numa lógica realista, no plano dos recursos disponibilizáveis, e, sobretudo, convergente com o novo ciclo de actividade associado à entrada em vigor do futuro QREN (seguramente em acção efectiva na primeira metade do ano de 2007), contribuindo, também, com projectos de mérito para o esforço global de relançamento competitivo do crescimento económico em Portugal.

Em terceiro lugar, importa salientar que um projecto com estas características só pode ser realizado se envolver financiamentos específicos relevantes de longo prazo (superiores a 25 anos), tendo o modelo desenhado previsto quer a intervenção do Banco Europeu de Investimentos, quer a intervenção das instituições financeiras nacionais mais vocacionadas para este tipo de operações (que na audição realizada pelo Comissariado se mostraram claramente interessadas em assumir um papel activo na dinamização das oportunidades de negócio que a recuperação da Baixa-Chiado lhes possa abrir).

O Banco Europeu de Investimento será certamente uma fonte de financiamento a longo prazo do Projecto de Reabilitação da Baixa-Chiado, nas suas várias componentes. A valia do Projecto de per si e a forma preconizada para a sua gestão integrada serão certamente aspectos que muito contribuirão para um acolhimento positivo por parte desta instituição.

Acresce que a apresentação do Projecto acompanhada com uma análise quantitativa numa base de custo-benefício para a economia nacional, para a região e para a cidade de Lisboa permitirá uma justificação sustentável do nível de investimento exigidos ao sector público. Será possível lançar este trabalho logo após a aprovação das linhas estratégicas do presente Projecto.